
Somos dependentes de “educadores”; sem estes, estamos condenados à ignorância!
Parece indiscutível que carecemos de educação, mas, necessariamente de “explicadores”? A educação depende sempre de um terceiro, um mestre, que nos abrirá os olhos para a realidade e aprendizagem? Sem isso não há progresso intelectual?
Paulo Freire, entre nós, defendia a Educação como um ato libertador. As pessoas, estimuladas, poderiam se tornar agentes que operam e transformam o mundo. A dominação é, antes de tudo, uma aceitação da crença de que somos incapazes, burros; de que precisamos que nos digam o que fazer e a quem obedecer.
Para ele, a Educação é um ato de busca permanente onde o próprio homem é o sujeito que opera e transforma o mundo através de uma clara compreensão do mesmo, que só será possível com a consciência da realidade concreta. Isso é, no mínimo, incômodo.
Ora, a experiência, e não a “verdade”, é o que dá sentido à educação.
Não era à toa que Hannah Arendt definia o totalitarismo como um tipo de “experimentos contra a realidade.”
“Tanto o homem que não consegue acreditar em seus sentidos, quanto aquele que não consegue acreditar em nada que não em seus sentidos são tolos, mas a tolice deles não é provada por um erro qualquer em sua argumentação, mas pelo evidente equívoco de sua vida inteira. (G. K. Chesterton)
Foucault dizia que escrevemos para transformar o que sabemos e não para transmitir o já sabido.
Gosto de falar de Joseph Jacotot: (https://balaiocaotico.com/2021/08/19/a-instrucao-e-como-a-liberdade-ela-nao-se-da-conquista-se-jacotot/)
Ele era um cara não-normal. Um revolucionário, exilado na Holanda, quando a França voltou a ser monarquia.
Ele era um “educador”, entendido como o exercício da autoridade e a submissão dos sujeitos que têm como objetivo a sua progressão até o limite de suas capacidades!
Jacotot, como um professor consciencioso, acreditou por muitos anos que a aprendizagem não acontece entupindo os alunos com conhecimentos, fazendo-os repetir como papagaios, mas, também, que seria preciso evitar os caminhos do acaso, onde se perdem os espíritos ainda incapazes de distinguir o essencial do acessório; e o princípio da consequência.
Aí, entrava a necessidade da “explicação”, a razão precípua do “educador”. Ensinar era, em um mesmo movimento, transmitir conhecimentos e formar os espíritos, levando-os, segundo uma progressão ordenada, do simples ao complexo.
Acredita-se, ainda, que ninguém nunca sabe, de fato, o que compreendeu; para que compreenda é preciso que alguém lhe tenha dado uma explicação. Só a palavra do mestre rompe o mutismo da matéria ensinada! Parece haver uma distância entre “aprender” e “compreender”.
Porém, como as crianças aprendem a língua materna? Elas aprendem a falar a língua de seus pais por sua própria inteligência e por intermédio de pessoas que não lhe explicam a língua.
Essa inteligência que lhe serviu até aqui passa a ser ignorada no sistema regular de ensino. Assume-se que as crianças só “compreendem” se alguém lhe repassar “explicações”, progressivamente.
Todo progresso do sistema educacional tende a resumir-se a aperfeiçoamentos dos métodos explicativos.
“Tal é a preocupação do pedagogo esclarecido: a criança está compreendendo? Ela não compreende? Encontrarei maneiras novas de explicar-lhe, mais rigorosas em seus princípios, mais atrativas em suas formas; e verificarei que ele compreendeu.” (Jacques Rancière)
Mas, e se for essa “necessidade de compreensão” o mal que interrompe o movimento da razão e destrói a autoconfiança da criança? Compreender significa, para ela, compreender que nada compreenderá, a menos que lhe expliquem.
Que pessoas saem desse processo, que implicitamente as anula para que possam ser “gente”?
Para Jacotot, as crianças devem ser colocadas diante da experiência; que todo raciocínio deve partir dos fatos e ceder diante deles.
Ao invés de se ter um mestre explicador, deveríamos ter um mestre emancipador, cujo papel é liberar as duas faculdades que estão em jogo no ato de aprender: a inteligência e a vontade.
Quando uma inteligência é subordinada a outra inteligência – a do mestre -, há um embrutecimento e o enfraquecimento dos futuros cidadãos. Eles são preparados para a subalternização, como regra geral.
“É preciso que eu lhes ensine que nada tenho a ensinar-lhes. Pode-se ensinar o que se ignora, desde que se emancipe o aluno; isso é, que se force o aluno a usar sua própria inteligência.” (Jacotot)