“Se a luz é o primeiro amor da vida, não é o amor a luz do coração?” (Balzac)

Shakespeare nasceu há 459 anos, num 23 de abril, e morreu há 407 anos, num 23 de abril. Esta referência é para homenageá-lo e falar sobre as asperezas da vida, que às vezes nos alça ao reconhecimento e, noutros momentos nos joga na lama.

Honoré de Balzac (1799-1850), aos 17 anos, foi estudar na Sorbonne e lá descobriu que a literatura poderia ser lida não por sua carga de verdades imperecíveis e sim como expressão da sociedade. Entre os autores que então conheceu estava Shakespeare, à época considerado um dramaturgo vulgar demais para ser incluído em qualquer currículo.

A efervescência política da sua época, o abandono que sentiu por parte da mãe, e os castigos sofridos nos internatos (onde foi um aluno rebelde – visto como “imprestável” – e que passava grande parte do tempo em cativeiros, solitário) talvez tenham despertado seu interesse pelos fatos corriqueiros, que não via como insignificantes, e dramas familiares e existenciais.

Na escola, tinha uma “invencível repugnância por qualquer trabalho prescrito”, segundo um professor. Não fazia os deveres na classe nem os exercícios convencionais.

Quanto aos constantes confinamentos, o influente Joseph de Maistre, via como uma coisa perigosa: “A pior companhia que um jovem pode ter é ele mesmo“.

No caso de Balzac, ao invés de cultivar amigos imaginários, investia na sua memória.

“Sempre que quero coloco um véu diante dos olhos. De repente me volto para dentro de mim mesmo e ali encontro um quarto escuro onde todos os acidentes da natureza se reproduzem numa forma muito mais pura que a forma sob a qual apareceram inicialmente diante de meus sentidos exteriores.”

Sua relação com a mãe lhe foi marcante. Ela havia casado aos 18 anos; o pai de Balzac já tinha 50 anos. Problemas. Ela tinha suas “distrações”. Em casa, era uma mulher ansiosa por impor autoridade – em substituição a demonstrações de afeto -, sempre pronta a interpretar a inteligência como insubordinação.

“Minha mãe me odiava ainda antes mesmo de nascer”.

“Eu era objeto de tal indiferença que muitas vezes a governanta se esquecia de me colocar na cama. Uma noite, tranquilamente instalado sob uma figueira, eu contemplava uma estrela com aquela curiosidade apaixonada que se apodera das crianças e à qual minha tristeza precoce acrescentava uma espécie de inteligência afetiva (…)”

Embora não seja unanimidade, sua obra fantástica e gigantesca (nos seus últimos vinte anos de vida escrevia mais de quatro livros por ano) encanta a todos que dela se aproximam. Segundo Henry James, ele foi o homem “que mais entendeu da vida humana desde Shakespeare”. Para Oscar Wilde, ele foi “o inventor do século XIX” e considerava que “ele criava vida, não a copiava”.

Reli recentemente, com outros olhos, o drama de Eugênia Grandet, a bela, submissa e sensível filha de um negociante extremamente sovina, um modelo de avarento. Como a bondade pode sobreviver em meio a infortúnios? Sua mãe, ao morrer sentiu compaixão da filha por ter de viver. Sua grande fortuna era como um empréstimo que precisava restituir, em dores.

Há tanto a dizer sobre Balzac e, uma enormidade, sobre suas obras!

Uma das mais “conhecidas” é “A mulher de 30 anos“, donde saiu a expressão “balzaquiana” como adjetivo para a mulher madura. Aliás, essa conotação foi criada aqui no Brasil.

“Balzac prestou um serviço imenso às mulheres ao duplicar para elas a idade do amor. Antes de Balzac, todas as namoradas de romance tinham 20 anos. Ele prolongou até os 30, 40 anos sua vida ativa, idade que considerava o ápice da vida amorosa da mulher.” (Marcelo Aith)

Essa vida, com desejos que desfilam à nossa frente, é uma armadilha. Há muitas portas abertas, mas poucas saídas.

Acalentar sonhos e propósitos de vida, amar desinteressadamente apesar das circunstâncias, agir com simplicidade e respeito ao próximo e outros idealismos são condenáveis, desde sempre. São rotulados como perda de tempo (vida).

Sobre isso, como alegoria, vale ler “A pele de Onagro” (La peau de chagrin). Onagro é uma “espécie” oriental de asno. Chagrin se traduz como “pesar”, em francês; “desgosto”, em inglês.

O personagem, Rafael, veio a possuir essa pele misteriosa, que permite a satisfação de todos os desejos, porém vai diminuindo de tamanho, enquanto também diminui o tempo de vida de seu possuidor.

“Por que falar a verdade se é mais proveitoso contar uma mentira?” Essa teria sido a primeira pergunta filosófica de Wittgenstein da qual se tem registro.

Publicado por Dorgival Soares

Administrador de empresas, especializado em reestruturação e recuperação de negócios. Minha formação é centrada em finanças, mas atuo com foco nas pessoas.

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