
Na imagem que ilustra o texto, de 1947, Norman Rockwell mostra uma família reunida em viagem.
Se a semana de trabalho for reduzida para quatro dias – ao invés dos cinco vigentes -, o mundo acaba ou as coisas podem melhorar? Qual a tua opinião?
A princípio teríamos mais lazer e a possibilidade de maior convivência com nossas crianças – reduzindo-se o isolamento (e os eventuais problemas mentais) em que pais e mães, que normalmente trabalham, as colocaram.
O português Pedro Gomes, professor da Universidade de Londres, num livro recente (“Sexta-feira é o novo sábado: como uma semana de trabalho de quatro dias poderá salvar a economia”) tornou-se um paladino dessa ideia.
Seu orientador no PhD, Christopher Pissarides (Nobel de economia em 2010), é outro entusiasta. Ele não se apavora com o avanço da AI sobre o mercado de trabalho.
Numa reportagem de Daniele Chiavenato, Pissarides defende que a disseminação da inteligência artificial aumentará a demanda por outros tipos de trabalho, sobretudo em setores da área de saúde, entretenimento e turismo. A lógica por trás é o aumento da expectativa de vida, bem como a redução da jornada de trabalho e uma consequente maior demanda por atividades de lazer.
Pedro Gomes, que há 7 meses passou a coordenar o projeto piloto da semana de quatro dias em Portugal, tem uma visão realista sobre o futuro do trabalho:
“Com o avanço tecnológico os trabalhos rotineiros estão a desaparecer, frequentemente substituídos por máquinas. Em contrapartida, a economia do século XXI está a criar trabalhos não-rotineiros abstratos, que exigem criatividade e maior esforço mental. Algumas empresas cujo funcionamento depende majoritariamente de tarefas rotineiras veem os empregados como descartáveis e facilmente substituíveis.”
Sobre o temor de uma eventual redução da carga semanal de trabalho, vale lembrar o pioneirismo de Henry Ford (que não era santo), em 1926.
Para surpresa de todos – principalmente de outros empresários -, Ford dobrou o fim de semana de um para dois dias em todas as suas fábricas de automóveis. As federações industriais previram uma catástrofe. Ele, porém, garantia que, descansados, seus empregados produziam mais e, se todos a adotassem, a economia sairia ganhando.
“As pessoas consomem mais no seu tempo de lazer do que no seu tempo de trabalho. Isso conduzirá a mais trabalho. E a mais lucros. E a mais salários. O resultado de mais tempo de lazer será exatamente o contrário do que a maior parte das pessoas crê que seria.” (Ford)
Anos depois, 1938, Franklin D. Roosevelt instituiu o salário mínimo, o adicional por hora extra e, uma jornada máxima de 44 horas semanais – depois reduzida para 40 horas. O desemprego caiu fortemente.
O ultraliberal Friedrich Hayek reconheceu que limitar jornadas de trabalho horizontalmente é uma intervenção estatal inofensiva ao mercado.
Outro insuspeito, Paul Samuelson, já afirmou que há invenções sociais decisivas, como pode ser a semana de quatro dias.
Por outro lado, Paul Lafargue, genro de Karl Marx, defendia em 1855, por outras razões, o direito à preguiça: “Uma estranha loucura está possuindo as classes operárias das nações em que reina a civilização capitalista. Essa loucura arrasta na sua esteira misérias individuais e sociais que, há séculos, estão torturando a triste humanidade. Essa loucura é o amor ao trabalho, levando ao esgotamento das forças vitais do indivíduo.”
Bom, naquela época burnout seria mimimi.
O fato é que ampliar o fim de semana dará às pessoas mais liberdade para escolherem como usar seu tempo. E, experiências-piloto já estão em curso em empresas dos EUA, Irlanda, Austrália e Nova Zelândia.
Sua adoção poderá estimular a economia pela maior demanda por entretenimento; pode-se esperar um aumento da produtividade e mais inovações desenvolvidas no tempo livre; seria também uma resposta ao desemprego tecnológico; e, trará um aumento da massa salarial.
Essa medida, conjugada com a implantação de uma renda universal básica (defendida até por Elon Musk!), poderão atenuar os níveis de desigualdade e, quem sabe, reduzir a polarização na sociedade, com o esvaziamento de movimentos populistas.
Há décadas já existem experiências de jornadas alternativas, além do que tem ocorrido em EUA, Irlanda, Austrália e Nova Zelândia. Temos experiências em países como México e Espanha e em outros países também.
Com o ultra neo liberalismo e a Covid, algumas experiências ficaram descontinuadas, outras surgiram e outras se mantém, cada região ao seu modo.
Já víamos jornadas não somente semanais, mas também diárias, menores; como com intervalos maiores no dia, quando os trabalhadores podiam inclusive ir até suas casas e descansar ou cuidar de afazeres como buscar os filhos na escola ou resolver compromissos ou problemas pessoais e depois voltarem ao trabalho.
Já se havia percebido que menor exploração da capacidade de trabalho e aumento de momentos de lazer real melhora a produtividade.
Já estava sendo percebido também que o trabalhador tendo mais tempo para dedicar-se a si e seus momentos de descanso e lazer, não havia prejuízo à economia local. Pelo contrário: com mais tempo de convivência com família e amigos, melhorava a saúde física, emocional e social do indivíduo, que, além disto, “recebia” mais tempo e condições de consumir. Lazer também move o mercado e a economia, além de melhorar a produtividade e reduzir os gastos com a saúde do trabalhador. Só não se justifica alterar a jornada e reduzir a renda, os salários, já que a produtividade aumenta e o indivíduo precisa de capital para consumo e convivência em família.
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