
“O tempo que vivemos é um tempo no qual as pessoas que tomaram o poder não se importam mais com os ancestrais, não se importam com os descendentes. Como podemos raciocinar com pessoas que têm arrogância de pensar que a morte delas significa o fim do mundo?” (Lewis Ricardo Gordon)
As pessoas estão perdendo a perspectiva histórica: o passado nada lhes ensina e o futuro é opaco. Vivem o presente, então? Não. O presente é um vazio. Não nos vemos como sujeitos históricos, “como lugar de partida e como destino de um sonho”, no dizer de Mia Couto.
Cultivamos displicentemente nossa infelicidade e, “os infelizes gostam de se unir uns aos outros”, falava Gotthold Lessing. Na prática, a raiva individual, gerada a partir do vácuo existencial, ao não encontrar uma expressão política adequada termina por alimentar os movimentos populistas.
Abrimos mão do direito de fazer escolhas de forma reflexiva; alguém, ou um algoritmo, faz isso por nós. Somos escolhidos, somos estatísticas, dados, objetos do mercado – e da política.
Desistimos de “ler” a realidade e de pensarmos como agente no mundo. Ler (do latim “legere“) significa “escolher”. Daí vem a palavra “eleger”.
“Quando se quer dominar um povo, desumanizá-lo ou escravizá-los, é preciso convencê-lo de que ele não tem capacidade de pensar.” (Lewis Ricardo Gordon)
O que chamamos de tempos sombrios, François Dubet designa como “tempo das paixões tristes”, quando as desigualdades se diversificam e até se individualizam.
Lembro que, para Espinosa, paixão é a modificação que um corpo tem em sua potência, sua capacidade de existir; as paixões tristes são aquelas que diminuem a potência, que enfraquecem nossa existência.
Daí Marilena Chauí concluía: “Liberdade é afastar as paixões tristes”.
“O sofrimento social não é mais experimentado como uma provação que exige lutas coletivas, mas como uma série de injustiças pessoais, discriminações, experiências de desprezo, questionamentos da autoestima. O regime de múltiplas desigualdades gera uma sociedade raivosa. Eis o mundo de hoje.” (Dubet)