
Algofobia, o medo da sensação de dor.
A dor não é apenas assunto médico, também é sociológico. Nossa tolerância à dor tem diminuído rapidamente. Essa angústia tem por consequência uma “anestesia permanente”, diz Byung-Chul Han.
Toda condição dolorosa é evitada, inclusive as “dores de amor”. O amor deixa de ser uma entrega total; há um risco implícito. As dores ‘políticas’ também são incômodas.
“A política se orienta em uma zona paliativa e perde toda vitalidade. A ‘falta de alternativa’ é um analgésico político. Em vez de debater e lutar pelos melhores argumentos, entregamo-nos à compulsão por sistema. Surge uma ‘democracia paliativa’.” (Byung-Chul Han)
A psicologia vai mudando de ‘psicologia negativa’ – psicologia do sofrimento -, para a ‘psicologia positiva’, que se ocupa com o bem-estar, a felicidade e o otimismo. Se estivermos sofrendo, há ‘analgésicos’, paliativos, que nos reintegram ao sistema. Sofrer é para fracos! Envergonhe-se!
Isso não é estoicismo, lembrando. Ser estoico não é ser insensível. É continuar agindo de maneira racional, mesmo em momentos de dor.
Veja a recomendação de Marco Aurélio para quando se sentir dor: “Perceba que isso não o desonra ou prejudica sua inteligência – não o impede de agir racionalmente ou de maneira altruística”.
Outra visão, de Khalil Gibran:
“Vossa dor é a quebra da concha que recobre a vossa compreensão. Assim como a casca da fruta deve se partir, vosso coração também deve ficar ao sol, para que conheçais a dor.
E que consigais manter vosso coração maravilhado com os milagres diários da vossa vida, que vossa dor não pareça menos maravilhosa que a vossa alegria. (…)
Grande parte da vossa dor foi vós que escolhestes.
É a poção amarga com que o médico dentro de vós cura vosso ser doente.” (Gibran)
A dor é inaceitável. Principalmente para o sistema econômico, que estimula o esgotamento físico e mental. O consumo de benzodiazepínicos (para reduzir a ansiedade), álcool, cocaína, crack e tantas outras drogas se alastra. Em nome da produtividade, da performance.
Há um personagem num livro de Haruki Murakami (“O incolor Tsukuru Tazaki e seus anos de peregrinação”) que cria uma empresa chamada “Beyond“, especializada em treinamentos e seminários de desenvolvimento pessoal. Seu principal curso era o “Creative business seminar“.
Como tantos que há por aí, era um curso de lavagem cerebral rápido e acessível para formar trabalhadores obedientes e dedicados. Em vez da ‘iluminação’ ou do ‘paraíso’, prometia promoções e altos salários, seguindo a nova religião da era do pragmatismo e meritocracia.
Um sucesso! Uma injeção de hipnose de um sistema de pensamento que atende os próprios objetivos. Analgésico, estimulante, relaxante.