
O sistema de conhecimento atual é compartimentado. Uma pergunta básica como “A que serve nossa existência?” recebe respostas parciais, seccionadas por áreas de especialistas. Falta-nos um estímulo ao pensamento complexo, que reúna conhecimentos esparsos e consiga articulá-los.
Isso dificulta termos uma visão conectada, integrada ao nosso contexto e nos leva à dissociação com o ambiente e com o social. Temos, então, um pensamento mutilado, que gera decisões erradas ou ilusórias.
Passamos, também, a atuar como seres incompletos, “focados em especialidades”, com pouca identificação com o todo e aversão ao diferente.
Essa nossa fragilidade é aproveitada por agentes políticos que procuram nos inserir em núcleos nos quais possamos ter algum grau de pertencimento, identidade. Pequenas teias sectárias.
As ideias de comunidade e nação são substituídas pelas de grupo (ideológico, identitário) e pátria.
O futuro é sinônimo de angústia, alimentada por incertezas. O presente é um emaranhado de ansiedade e insegurança. O passado, ao invés de raízes, torna-se um fardo.
A modernidade, o amor, o medo, a vida e o tempo, tornam-se líquidos, expressando a imensa facilidade com que estes elementos escorrem por nossas mãos, nos termos de Zygmunt Bauman.
Além de sermos objetos de manipulação política, o sistema econômico também tira proveito disso, segundo Christian Dunker, um dos organizadores do livro “Neoliberalismo como Gestão do Sofrimento Psíquico”.
“Em linhas gerais, o neoliberalismo é uma teoria que vai se expandindo para uma forma de psicologia, uma forma de moralidade, de resolver os conflitos humanos, pensar a religião, a arte, a vida. (…) O neoliberalismo como uma forma de vida interessada em gerir – no duplo sentido, de produzir e administrar – sofrimento”. (Dunker)
Os liberais clássicos viam o sofrimento do trabalhador como um problema que atrapalhava a produção; a forma de vida neoliberal, ao contrário, descobriu que se pode extrair mais produção do próprio sofrimento!
O neoliberalismo, além de uma teoria sobre o funcionamento da economia, desenvolvida principalmente por Ludwig von Mises e Friedrich Hayek, seria “uma forma de vida definida por uma política para nomeação do mal-estar e por uma estratégia específica de intervenção com relação ao estatuto social do sofrimento”.
A partir de três anos de pesquisas, os autores concluíram que o neoliberalismo é baseado em um conjunto de práticas de gerenciamento do mal-estar, como a individualização da culpa, o repúdio ao fracasso, o louvor ao mérito e a criação de um estado de crises e reformulações.
Tema interessante, acho. Continuaremos noutros artigos.
(Foto acima: Christian Dunker)