O social e o fiscal

Houve um tempo em que economistas eram humanos. Brincadeira.

Mas, quem leu John Stuart Mill e Adam Smith, além dos seus textos meramente “econômicos”, percebem que eles tinham uma preocupação com o social.

Smith: “A maioria dos governos é de ricos para ricos.“/ “Nossos mercadores e senhores reclamam muito dos maus efeitos dos altos salários em aumentar o preço e diminuir a venda de mercadorias. Eles não dizem nada sobre os maus efeitos dos altos lucros.

Mill:  ”devemos ter liberdade na busca pelo nosso próprio bem da forma que melhor nos apetece, desde que não interfira na possibilidade de os outros fazerem o mesmo. Mas a liberdade pode ter limitações.”

Outro que via a economia como um “meio” para a melhoria da sociedade era Alfred Marshall (1842-1924): “A economia só faz sentido enquanto meio para resolver os problemas do homem e mulher comum.”/ O mais valioso de todo o capital é o investido em seres humanos.”

Ainda, quero lembrar Hyman Minsky, que sabia que “banqueiros, negociantes no mercado de ações e outros atores financeiros periodicamente assumem o papel de agentes incendiários, levando toda a economia às chamas”.

Essa introdução é para abordar a polêmica levantada pelo presidente eleito (e as reações do “mercado” e de seus arautos) ao questionar a prioridade fiscal em relação à social e por defender objetivos de crescimento além das metas de inflação.

Antecipo que, na minha opinião, o social e o fiscal devem caminhar de mãos dadas, para que o social não seja largado no percurso (ou o contrário, como supõe o “mercado”).

Acho, também, que o crescimento econômico é a chave que abre quase todas as portas – de entrada ou saída: empregabilidade, crescimento da renda, inclusividade, avanço tecnológico, aprimoramento e alastramento da educação, consumo de cultura, pacificação social etc.

Entretanto, vejo que os pronunciamentos são de natureza política, balões de ensaio; nada de decisivo foi anunciado. São ataques “defensivos”. Defender-se do quê? Da dominância neoliberal, aquela que considera o lucro como referência de vida. Não quer tornar-se refém do mercado.

De qualquer forma, arguir contradições antecipadamente é uma forma de transparência. Que o mercado precifique.

Ou, maquiavelicamente, notícias “más” devem ser divulgadas de uma vez; as boas, ao longo de quatro anos.

A reação do mercado foi imediata (como convém) e ameaçadora. Neste momento (17/11/22), o Ibovespa caiu a 107.810 pontos e o dólar chegou a R$ 5,45! Os contratos de juros futuros (vencimento em 2024) chegaram a 14,11%.

Comentando os juros futuros. A taxa básica (Selic) é definida pelo Banco Central; não é determinada pelo mercado. O overnight, a taxa de juros de um dia, é a taxa sem risco para o prazo mais curto da economia. A curva de juros futuros, a yield curve, indica apenas a expectativa (ou desejo) do mercado quanto a uma futura alta ou baixa da taxa básica. Mas, a decisão é do BC. Para reduzir variações bruscas adotou-se o “forward guidance”.

O câmbio. Esse é perigoso, porque muito volátil. Há massas de recursos cambiáveis que chegam ou fogem da economia ao sabor da confiança ou medo. São volumes especulativos. O BC pode, se quiser, amainar isso, com venda ou compra de reservas.

O câmbio real depende do fluxo de transações correntes. Aí há agentes com visões de maior prazo. Vejam: o câmbio chegou a este patamar; no governo atual ele já chegou a 5,65 e o mundo não caiu.

O Real desvalorizado gera inflação, óbvio? Sim e não. Inflação é o aumento “continuado” dos preços. Se houver um aumento abrupto de preços (ou de câmbio) e parar por aí, os preços relativos tendem a se acomodar a este novo patamar. O problema, ainda, é que há muitos preços indexados que podem levar a uma inflação inercial renitente.

Um amigo crítico, Luiz Simi, fez um comentário sobre um post anterior. Fala que o monetarismo não está morto: está, a versão de Milton Friedman. Como os neoliberais, principalmente, defendem que o Estado precisa ser contido, surgiu a Teoria Fiscal do Nível de Preços, que considera o nível de endividamento estatal.

Paremos por aqui.

Publicado por Dorgival Soares

Administrador de empresas, especializado em reestruturação e recuperação de negócios. Minha formação é centrada em finanças, mas atuo com foco nas pessoas.

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