
A vida humana provém, descende, da vida da Terra. Muitos ignoram isso, ou fingem desconhecer, como se fossem extraterrestres. Há quem tenha dificuldade de perceber a vida que nos atravessa ininterruptamente.
“A vida é somente a borboleta dessa enorme lagarta que é Gaia, ela é a metamorfose deste planeta”, diz, poeticamente, Emanuele Coccia (foto).
“Nossa vida, aquilo que imaginamos ser o que há de mais íntimo e incomunicável em nós, não vem de nós, não tem nada de exclusiva ou pessoal: ela nos foi transmitida por outrem, animou outros corpos, outros pedaços de matéria, além daquela que nos abriga.
Durante nove meses, o lado inapropriável e inassinável da vida que nos anima e nos desperta foi uma evidência física, material. Fomos o mesmo corpo, os mesmos humores, os mesmos átomos que a nossa mãe.
Somos essa vida que compartilha o corpo de um outro, prolongada e levada para outro lugar.
É o sopro de um outro que se prolonga no nosso, o sangue de um outro que circula em nossas veias, é o DNA que um outro nos deu que esculpe e cinzela nosso corpo.” (Coccia)
Somos parte; somos uno; temos a mesma origem; compartilhamos o mesmo ar, embora nem sempre da mesma qualidade.
Apesar disso, não temos acesso equivalente aos demais recursos naturais; esses são altamente concentrados em termos fundiários, territoriais e da riqueza acumulada.
Tudo fica após nossa transição, mas as “posses” são herdadas e pereniza o processo de exclusão. Essa é a lógica do sistema: tudo se resume a conquistar, deter e perpetuar entre os familiares. Daí nasce a política, a luta por uma melhor partilha dos bens e renda.
Nessa disputa, a arena dos embates, a Terra, é negligenciada, relegada a um palco onde ganância e ignorância destroem nossa mãe, origem e guardiã da vida.
O meio ambiente está em risco extremo. E há governos, como o atual, que são insensíveis e estimulam a violação do que deveria ser tratado respeitosa e inteligentemente.
O crescimento demográfico e a ansiedade anabolizada por consumo de bens e serviços têm levado a uma exaustão de recursos, que é feita – normalmente – de forma irresponsável, egoísta.
Somos, até aqui, uma espécie bem sucedida, segundo os padrões que definimos para “sucesso”. Mas nossa história é muito curta no horizonte da vida no planeta. Agimos como se fôssemos eternos, mas poderemos ser, logo, mais uma espécie curiosa, extinta.