
Eclesiastes nos traz ao chão. Mostra nossa insignificância diante da vida. Quando feliz ou triste, convém retornar às palavras de Coélet, aquele que fala na assembleia, o pregador, identificado por muitos como Salomão.
A Bíblia é interessante, se lida com desprendimento. As crônicas bíblicas, muitas com ensinamentos e valores essenciais, não podem ser vistas como “certezas”, mas como registros e inspirações para reflexão. Só um exemplo: no livro 1 Reis (7:23) há uma descrição do palácio de Salomão. Este teria um reservatório para banhos com dez côvados de diâmetro e 30 de circunferência. Por esses dados, o Pi seria 3 (30/10). Arredondamento?
Na criação do mundo, Deus caprichou. E, tinha um sistema de controle de qualidade; uma vez feito Ele mesmo atestava se era bom. Quando chegou a vez do homem, ele não verificou se a criatura era boa. Deu no que deu.
Ora, se o homem foi feito à Sua imagem e semelhança, por que Deus estranhou e reprovou a curiosidade “natural” de Eva e a cumplicidade de Adão ao experimentarem o fruto proibido? Pior, Deus só perceberia a desobediência quando os viu cobertos com folhas de figueira!
Eles descobriram o senso ético, o bem e o mal. Depois inventaram a moral e tudo ficou mais restrito.
Aliás, o homem é estranho, adora se limitar. Deus só criou um mandamento, proibindo comer da Árvore do Bem e do Mal. Moisés, posteriormente, deixou dez mandamentos (que chegaram até nós). Já em 1545, no Concílio de Trento, a Igreja proibiu 272 coisas! Hoje, ninguém sabe quantas são as proibições.
Àquela transgressão primeira, santo Agostinho denominou “pecado original“. A pena tornou-se hereditária. Uma boa tese para nossas imperfeições. Eva e Adão teriam optado por trocar o Sumo Bem (de Deus) pelo conceito de bem humano. Mas, e a semelhança divina?
Voltando ao Eclesiastes, que fala sobre a vaidade das coisas humanas.
Este livro, que possivelmente foi escrito no século III a.C., quando a Palestina estava submetida aos Ptolomeus, traz aproximações com a filosofia grega (estoicismo, epicurismo e cinismo).
Descreve que tudo é decepcionante: a ciência, a riqueza, o amor, até a vida. Esta não é mais do que uma série de atos incoerentes e sem importância, cujo fim é a velhice e a morte, a qual atinge igualmente sábios e néscios, ricos e pobres, animais e homens.
A humanidade vive eternamente insatisfeita; a saída é consolar-se e curtir o momento (carpe diem).
No livro também há lições de desapego aos bens terrenos e, negando a felicidade dos ricos, prepara o mundo para entender que “bem-aventurados são os pobres”, conforme diria Lucas em 6,20. Os neoliberais não devem lê-lo.
“Que proveito tira o homem de todo o trabalho com que se afadiga debaixo do sol? Uma geração vai, uma geração vem, e a terra sempre permanece”. (1, 3-4)
“O que foi, será, o que se fez, se tornará a fazer: nada há de novo debaixo do sol!” (1, 9)
“A sabedoria é mais proveitosa do que a insensatez, assim como o dia é mais que as trevas. O sábio tem os olhos na cabeça, mas o insensato caminha nas trevas.
Porém compreendi que ambos terão a mesma sorte. Por isso disse em mim mesmo: ‘A sorte do insensato será também a minha; para que então me tornei sábio?” (2, 13-15)
A questão presente, @Dorgival Soares, é os insensatos não sabem que são insensatos. Se soubessem, não seriam.
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