Cinismo e política

(Ruy Barbosa de Oliveira, 1849-1923)

O cinismo domina a política e alguns setores sociais e econômicos.

Não me refiro à corrente filosófica do Cinismo, que influenciou os estoicos e pregava o total desprezo pelos bens materiais. Sua origem deu-se com Antístenes (445-365 a.C.), discípulo de Sócrates. O cínico mais conhecido é Diógenes de Sinope (404-323 a.C.).

A conotação para o cínico que cito é a coloquial: desavergonhado, impassível, descarado …

A democracia se deteriora, atacada fortemente por movimentos tradicionalistas e reacionários, mesmo os de esquerda.

Peço que não confundam os reacionários com os conservadores; estes defendem a manutenção de seus princípios e valores (inclusive a democracia), enquanto que os reacionários pregam um “retorno” a um tempo idealizado, como a Idade Média, os tempos da ditadura militar, o stalinismo etc.

O político médio atual não se incomoda com o povo que o elegeu; sabe que este ou se omite ou se deixa abduzir por seus discursos ocos. Estou generalizando apenas para melhor entendimento; sei que há pessoas que têm senso de cidadania e mantêm uma posição crítica diante dos governantes.

A rigor, a democracia sempre foi criticada – isso não é ruim; ela pode evoluir -, desde os primórdios gregos. Como ela é aberta, sempre se mostrará frágil e insuficiente.

Mas é incomparavelmente melhor do que os sistemas fechados, guiados por “iluminados”, mitos ou qualquer outro termo para “Vossa Excelência”, porque, repetindo Ruy Barbosa, “A liberdade não é um luxo dos tempos de bonança; é o maior elemento da estabilidade.”

A democracia pode, então, ficar descaracterizada e tornar-se uma farsa. Um dos pontos mais corruptível é o da representação política. Outro é o balanço entre os poderes. E, o mais vulnerável pode ser o respeito às instituições e ao primado da lei, expresso pela Constituição.

Ruy, sabemos, via a lei como sustentáculo da democracia. A lei, não como entidade abstrata, no papel, mas garantida pelo Judiciário, sob a égide do Supremo Tribunal Federal.

Mais, via o STF como o herdeiro do Poder Moderador, acima das facções e dos interesses.

“A soberania, que é o poder, tem de ser limitada pelo direito, que é a lei.

Daí a necessidade, que se impõe à democracia, especialmente no regime presidencial, de traçar divisas insuperáveis aos três órgãos da vontade nacional: ao administrativo, ao legislativo, ao próprio constituinte, mediante estritas condições postas à reforma constitucional.

E a justiça é a chave de todo este problema, o problema da verdade republicana.

Mas é a justiça, ao estilo americano, árbitro da interpretação constitucional, oráculo da validade das leis, escudo ao indivíduo, à associação, aos Estados contra os excessos do mandonismo em todas as suas violências ou trapaças: o dos presidentes desalmados, o das legislaturas corruptas, o dos bandos audaciosos, o das satrapias insolentes.

Se tirarem essa justiça, o que nos fica é a hipocrisia demagógica do caudilhismo a revezes civil ou militar, o caiado sepulcro dessas repúblicas de sangue e lama, desordem, pobreza e ignorância …” (Ruy Barbosa, 1909)

Nos tempos difíceis em que vivemos, com a sombra do autoritarismo à espreita, convém lembrar Alceu Amoroso Lima: “Há silêncio e silêncio. Há o silêncio do bem e o silêncio do mal. Há silêncio da liberdade e o silêncio da opressão. Deus é o silêncio do bem e da liberdade”.

Publicado por Dorgival Soares

Administrador de empresas, especializado em reestruturação e recuperação de negócios. Minha formação é centrada em finanças, mas atuo com foco nas pessoas.

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