
Convenhamos, termos gente passando fome atualmente é um escárnio, uma maldade, uma ignorância do que é a vida. Você pode passar toda a sua vida bem nutrido, ignorando a fome que nos rodeia, mas nunca será alimentado de humanidade, a não ser que adquira uma sensibilidade pela dor alheia.
A fome é atroz!
Só quem a experimentou entende a não manutenção da vida pela não atenção às suas necessidades. Isso não depende só do indivíduo, mas da sua comunidade.
A primeira liberdade é a de viver!
“Hoje estou exuberante/ estou poroso de poesia/ como o liberto/ recém-saído da cadeia/ eu canto …”
Liberdade foi o mote da vida de Solano Trindade, pernambucano, embora esta também não seja gratuita.
Em 1944, após publicar o poema “Tem Gente com Fome”, ele foi preso e perseguido, e o livro apreendido.
A “realidade” não aceita o real: pessoas passavam fome; hoje, milhões redescobriram a fome, assim como a varíola!
Francisco Solano Trindade era cineasta, teatrólogo, pintor, ator, folclorista e poeta. Era, também, militante do Movimento Negro. Morreu num asilo, pobre e esquecido.
“ia falar do seu corpo/ de suas mãos/ amada/ quando soube que a polícia espancou um companheiro/ e o poema não saiu’’. (década de 1920)“mataram o Ozeias/ um sujeito bom/ Ozeias desejava universidade para brancos e pretos/ e por isso mataram Ozeias’’.
TEM GENTE COM FOME
Trem sujo da Leopoldina,
Correndo correndo,
parece dizer:
Tem gente com fome,
Tem gente com fome,
Tem gente com fome …
Piiiii!
Estação de Caxias,
De novo a correr,
De novo a dizer:
Tem gente com fome,
Tem gente com fome,
Tem gente com fome …
Vigário Geral,
Lucas, Cordovil,
Braz de Pina
Penha Circular,
Estação da Penha,
Olaria, Ramos,
Bom Sucesso,
Carlos Chagas
Triagem, Mauá,
Trem sujo da Leopoldina,
Correndo correndo
Parece dizer:
Tem gente com fome,
Tem gente com fome,
Tem gente com fome …
Tantas caras tristes,
Querendo chegar,
Em algum destino,
Em algum lugar …
Trem sujo da Leopoldina
Correndo correndo,
Parece dizer:
Tem gente com fome,
Tem gente com fome,
Tem gente com fome .
Só nas estações,
Quando vai parando,
Lentamente,
Começa a dizer:
Se tem gente com fome,
Dai de comer …
Se tem gente com fome,
Dai de comer …
Mas o freio de ar,
Todo autoritário,
Manda o trem calar:
Psiuuuuu ..
AMANHÃ SERÁ MELHOR
Nas manhãs de sol
O trabalhador
Sai pra trabalhar.
Nas manhãs chuvosas
O trabalhador
Sai pra trabalhar.
É a natureza
E o trabalhador
Sempre a trabalhar
Que constrói o mundo
Que constrói a vida
Sempre a trabalhar.
Quais as esperanças
Do trabalhador?
Não posso dizer
Ele dá tudo
Nada ele tem
Quais as esperanças
Do trabalhador?
Pelos campos
Pelas fábricas
Estou sempre a perguntar
Quais as esperanças
Do trabalhador?
Nas zonas miseráveis
Eu fico a perguntar
Quais as esperanças
Do trabalhador?
Nos hospitais
Nas cadeias
Eu fico a meditar
Quais as esperanças
Do trabalhador?
Toma forma de ritmo
Toma forma de canto
Sempre a mesma pergunta
Quais as esperanças
Do trabalhador?
Tem gente com fome , começarei meu simples arrazoado com o título “tem gente com fome”, a fome como diz o texto é um escárnio, uma das necessidades básicas e prordial para se viver: é comer. E transportando para nossos dias o tema é muito atual e latente. A fome no mundo não é de hoje . Uns gordos de tanto comer e outros magérrimos de fome.
Devaneia o poeta: uma vez que a fome nos faz devaneiar e nos tira a consciência, quando associa a fome ao trem em movimento da velha estação ferroviaria Leopoldina “Trem sujo da Leopoldina,
Correndo correndo,
parece dizer:
Tem gente com fome,
Tem gente com fome,
Tem gente com fome …
Piiiii!. ” quantos hoje em nossos dias estão a devaneiar?. Mesmo que por mais simples que levamos a vida . Despojadamente de coisas supérfluas, e passamos a ver beleza em tudo. É fato que a fome é iminente, e inimiga de todo ser vivo. Especialmente do ser humano e dos animais. Me abstenho a entrar aqui em questões políticas/ ou famélicas que vivemos hoje bem perto de nós. E me atenho apenas ao teor poético ao texto bem escrito que o autor me propôs:
A fome.
“Já dizia o poeta contemporâneo “se tem gente com fome dá de comer”. O texto é vasto e bem elaborado de nuances mas o tema que não podemos fugir é: Tem gente com fome..” acrescentaria como diz nosso imortal poeta e cantor.:,”dá de comer”.
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