
Em 1948, Bertolt Brecht retornava a uma Alemanha em reconstrução, mas já dividida pela Guerra Fria. Havia passado quinze anos no exílio, boa parte deles com os nazistas em seus calcanhares.
Com o fim da guerra, acabara a perseguição baseada em opções políticas? Não. Ainda em Los Angeles, antes da sua volta, fora interrogado por membros do Comitê de Atividades Antiamericanas (macartismo).
Seu périplo para escapar dos nazistas incluiu a Tchecoslováquia, Áustria, Suíça, França, Dinamarca, Suécia, Finlândia, União Soviética e, finalmente, Estados Unidos.
Nesse período escreveu sobre esses ambientes, inclusive sobre democracia. Algumas frases:
“É muito difícil a democracia a dois.” (vejam o casamento!)
“… os cães adquirem uma aparência mais democrática depois de comer uma boa dose de ração.”
“Não desanime! Desanimar é o erro de todas as democracias. Você não pode negar que a Alemanha teve uma aparência absolutamente democrática até adquirir a aparência fascista.”
“O povo assume o poder apenas nas situações extremas. Assim se passa porque o homem pensa apenas quando se vê em situações extremas, e receia o caos.”
“Com a ditadura, não terão nada no estômago e não poderão sair para enterrar seus filhos, mas haverá ordem e eles quase não terão de pensar.”
QUEM SE DEFENDE (Brecht)
“Quem se defende porque lhe tiram o ar
Ao lhe apertar a garganta, para este há um parágrafo
Que diz: ele agiu em legítima defesa. Mas
O mesmo parágrafo silencia
Quando vocês se defendem porque lhes tiram o pão.
E no entanto morre quem não come, e quem não come o suficiente
Morre lentamente. Durante os anos todos em que morre
Não lhe é permitido se defender.”
NO NASCIMENTO DE UM FILHO (poema de Su Tung-po, 1036-1101)
“Famílias, quando lhes nascer um filho
Façam votos de que seja inteligente.
Eu, que pela inteligência
Arruinei minha vida
Posso apenas desejar
Que meu filho se revele
Parvo e tacanho.
Assim terá uma vida tranquila
Como ministro do governo.”
“Um estrangeiro, voltando de uma viagem ao Terceiro Reich
Ao ser perguntado quem realmente governava lá, respondeu;
O medo.”
Um pouco de história:
Friedrich Ebert (1871-1925) foi um político alemão social-democrata. Em 1919, foi eleito o primeiro presidente da República alemã recém-fundada, após a renúncia do imperador Guilherme II.
Pela primeira vez, um homem do povo assumiu o cargo de chefe de Estado. Era filho de um humilde alfaiate.
Na posse, disse: “A essência da nossa Constituição deve ser, sobretudo, a liberdade. Mas toda liberdade da qual muitos participam, precisa ter suas regras.”
Nos anos de 1919 a 1923, reprimiu com extrema violência o movimento revolucionário.
Extremistas de esquerda e de direita estavam insatisfeitos com Ebert. Ele era motivo de zombaria e de calúnias. Chamavam-no de “filho de prostituição, beberrão, rato de esgoto, corrupto”, acusando-os de usar o cargo para enriquecer.
Sobre ele, Brecht escreveu:
“Os generais derrotados (na I Guerra) colocaram um extenso cabo telefônico à disposição do taberneiro Ebert, conectando-o com o quartel-general para que ele pudesse chamar, caso o povo se impacientasse.
Os conselheiros ministeriais e os altos juízes conferenciavam com ele, como se fosse a coisa mais natural do mundo, e se por vezes tinham de tapar o nariz, isso era apenas a prova cabal de que já não podiam ir aonde quisessem, que tinham de procurar o taberneiro Ebert.
Caso contrário, perderiam seus postos e pensões.”
Nada muito diferente de nossa realidade!