
“Poucas coisas simbolizam o futuro tão poderosamente quanto as crianças – e agora, a incerteza do futuro está cobrando seu preço.
Nesta última semana, tive várias conversas com amigos de todo o mundo que estão lutando com a complexidade de orientar seus filhos em transições críticas em nosso contexto atual.
Seja de criança para criança, de criança para adolescente ou de adolescente para adulto – os últimos dois anos impactaram severamente os jovens.
Rituais de limiar essenciais foram afetados ou até “roubados” por bloqueios e distanciamento; dois anos é muito tempo na vida de uma criança.
As estatísticas sobre problemas de saúde mental e até suicídio entre crianças em todo o mundo são surpreendentes e preocupantes.”
(Sonja Blignaut)
O mundo está sombrio, triste e preocupante. Minha quota de otimismo está sendo testada.
Não são apenas as estonteantes transições tecnológicas; são principalmente a insensibilidade humana com o seu entorno – os outros e o ambiente – e, a ganância, o individualismo apregoado pelo liberalismo.
O poder, sempre nas mãos dos endinheirados (os políticos são caudatários e marginalmente beneficiados), despreza o crescente empobrecimento da população (carências e falta de oportunidades) e retira as esperanças num futuro melhor, pelo menos para nossos filhos e netos.
Tenho oito netos em variadas idades críticas, sem referências basilares, sem entendimento do que poderão ser quando adultos (as “profissões” estão se esfarelando), congestionados pelas infestação das redes sociais, pelos estímulos a valores fúteis, por amizades líquidas, intolerâncias, pela irresponsabilidade dos adultos na preservação de um mundo menos conturbado (habitável), sem entender a vivência em escassez na realidade de abundância …
Sempre houve épocas de crises e o humano conseguiu escapulir dessas situações críticas. Agora é diferente, o desarranjo me parece crônico.
Mas, a desesperança não me vence; há um grande desafio à frente; entretanto não podemos deixar a adaptação necessária a cargo exclusivamente da geração que nos sucederá. É necessário que nos apercebamos do que ocorre. É uma transformação em larga escala.
Como diz Frank Diana, o futuro precisa ser reimaginado. Esse pode ser mais um ponto de inflexão na história humana – e eles mudam o significado do ser humano.
Byron Reese afirma que para dizermos corretamente que nos lançamos em uma nova era, algo deve vir que nos mude e altere a forma como vivemos, de maneira profunda e permanente. Algo que altere nossa trajetória como espécie.
Esta pode ser uma inflexão tão relevante quanto a primeira, quando a linguagem e o fogo nos colocaram na trilha de “dominação” do mundo.
O primeiro passo, ao meu ver, está na educação, que deveria se voltar para a “vida” e não para “profissões”. Aprender a conviver com as diferenças, com respeito, e o cultivo da ideia de comunidade global (estou simplificando, claro).
Não faz mais sentido perguntar às crianças o que elas serão quando crescerem, como se ainda nada fossem.
Na tradição védica fala-se em eras. Estaríamos na Kali Yuga, a Idade do Ferro. Decaímos, sucessivamente, da Krita Yuga (Idade de Ouro), Treta Yuga (Idade da Prata) e Dwapara Yuga (Idade do Bronze).
Esta nossa era (Kali Yuga) é uma era obscura, em que a virtude moral e as habilidades mentais atingem o ponto mais baixo no ciclo.
Segundo o Mahābhārata, o Kali Yuga seria o período em que a “Alma do Mundo” é escura em sua tonalidade; restando apenas um quarto da virtude, que vai diminuindo lentamente para zero ao seu final. Os homens entregam-se à perversão; a doença, a lassidão, a raiva, as calamidades naturais, a angústia e o medo da escassez prevalecem.
Será?
Enquanto deslizamos montanha abaixo, como um esquiador desgovernado, nos sentimos aliviados pela ausência de “obstáculos” que deteriam, eventualmente, nossa “decadência”, sem perceber que o final pode ser apenas um interminável abismo.
A caravana continua sua jornada e, agora, em silêncio; nem mesmo os cães arriscam nos seguir em nosso desatino.
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