
Atualizando os versos de Carlos Drummond de Andrade, de 1954, André Vallias escreveu:
“como ficou chato/ ser contemporâneo/ serei instantâneo
agora
como ficou chato/ ser instantâneo/ serei um autômato
agora
ae10-i6-o16-u4/ c7-f2-gh2-m5/ n8-p1-r7-s6-t9″
Adriana Calcanhotto, em 2017, fez uma antologia pessoal da poesia contemporânea. Para ela, “depois do fim das vanguardas, ficou ainda mais difícil escrever poesia”. Selecionei alguns dos poemas.
“tem alguém aqui
tem que eu vi um vulto
tem que ouvi os passos
a voz o gesto
tem alguém aqui que é resto
ou insulto
alguém que é incerto
tem alguém aqui que se perdeu
sombra
assombração
lembrança
presença
sou eu”
(Estrela Ruiz Leminski)
“Como continuar a ser a mesma pessoa
depois de ter conhecido a Fontana di Trevi?
Você me dirá o quanto eu sou tola
e que o conta-gotas dos dias
nos transforma permanentemente …
Eu estaria, com gosto, de acordo
se não fosse a pequena moeda
que, do fundo da água,
cintila redonda meus cinco centavos
de desejos impronunciáveis”
(Camila Nicácio)
Gênese II
“no princípio era o verbo
uma vaga voz sem dono
vagando pela via láctea.
depois veio o sujeito
e junto com ele todos
os erros de concordância.” (Gregório Duvivier)
Jabs
“não gostava muito dos animais
achava-os burros, ignorantes, simplórios
andava encantada com as descobertas humana
hoje não gosta muito do mundo que descobriu
e o que importa é o afeto com que corta
a casca de meio mamão e pica duas folhas
de alface todas as manhãs para o jabuti”
(Maria Cecília Brandi)
“Quando me convenci
de que eu era imortal
veio o Doutor e disse:
– É câncer …” (Donny Correia)
“Entende o que estou dizendo?
Dar é feminino de dor.
O etimólogo
que persegue palavras
(dando proteína
para a filosofia)
dirá que não.
DAR É VERBO.
Verbo é masculino.
Entende o que estou dizendo?
É másculo dizer ‘no princípio
era o verbo’. “
(Bianca Lafroy)
Muito bom o texto. Paradoxo. Como mesmo expressa a cantora e compositora Adriana Calcanhoto. De fato ficou muito muito esquisito ser moderno. Ou envelheci ou a minha compreensão não vai além de certos textos escritos. Domingo agora assisti a Orquestra Sinfônica e um imortal ( mortal) cantava o povo o aplaudia de pé e eu não compreendia os trocadilhos exuberantes de suas músicas. Algo ficou muito chato. Prefiro o lirismo onde todos falam línguas sem trocadilhos atingindo o coração de todos. Estamos mais sábios? Ou estamos mais confusos? . A lingua portuguesa por si só não precisa de interpretações ela deve e deveria alcançar todos. Com razão, escreveu Adrina Calcanhoto ” Adriana Calcanhotto, em 2017, fez uma antologia pessoal da poesia contemporânea. Para ela, “depois do fim das vanguardas, ficou ainda mais difícil escrever poesia”. Essa é minha opinião também de quem se se atreveu um dia também escrever poemas.
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