
“Você já teve um sonho, Neo, que parecia ser verdadeiro? E se você não conseguisse acordar desse sonho? Como você saberia a diferença entre o mundo dos sonhos e o mundo real?” (Diálogo entre Morpheus e Neo, na trilogia do filme Matrix).
António Damásio, no livro O Erro de Descartes, procurou destacar que a emoção é essencial na produção da razão. Noutro livro importante, O Mistério da Consciência, investiga de que maneira atravessamos o limiar que separa o ser do conhecer, ou seja, como o nosso organismo toma contato com os objetos do mundo e como se apercebe de si mesmo nesse ato de conhecer.
Essa era a distinção que Aristóteles fazia sobre os seres humanos: o desejo de compreender e o apetite por admirar-se com sua própria natureza.
O que seria mais difícil de conhecer do que conhecer o modo como conhecemos?
Stephen Hawking e Leonard Mlodinow, afirmaram que “a Filosofia está morta”. A ciência seria o caminho. Afinal, segundo Mlodinow, “com a Física podemos observar o mundo, formular uma teoria, montar um experimento e fazer previsões.”
Acrescenta que “a ciência diz que tudo segue um conjunto de leis. Queremos saber quais são essas leis, e não acreditamos que haja exceções ou milagres. (…) Talvez essas leis que regem o Universo sejam a definição de ‘deus’.” Ora, esse é um argumento que dá subsídio ao defensores do Design Inteligente.
Mario Bunge, que além de físico era filósofo, lembra que “de vez em quando os filósofos estão aptos a corrigir a ciência ou, antes, os cientistas que se extraviam.” Dá vários exemplos, no seu livro “Matéria e Mente”.
“Tanto as teorias criacionistas quanto as teorias cosmológicas do estado estacionário foram atacadas por violar o princípio ontológico de Lucrécio (ex-nihilo nihil fit): as primeiras postularam a origem do universo a partir do nada e as segundas postularam a criação espontânea da matéria.” (Mario Bunge)
A rigor, o princípio de que “nada surge do nada” é possivelmente de Parmênides e ficou conhecido através do livro de Lucrécio. Aliás, esse princípio explica muito da política brasileira.
Deixemos esses assuntos para outras conversas; voltemos à mente.
Num livro de 2012, Mlodinow (que é físico!) voltou-se para o estudo da mente e percebeu que o inconsciente é tão importante quanto a consciência: o inconsciente tem um papel relevante e, às vezes, despercebido. Talvez tenha sido provocado pela parceria com Deepak Chopra, já que nesta época escreveram “Ciência x Espiritualidade”.
Afirma que “a parte inconsciente da mente dispõe de conhecimentos que escapam da parte consciente.”
“… o trabalho feito pelo inconsciente é uma parcela crucial do nosso mecanismo evolutivo de sobrevivência.
(…) dispomos de uma vida inconsciente rica e ativa, que funciona em paralelo a nossos pensamentos e sentimentos conscientes, e exerce poderoso efeito sobre eles.” (Mlodinow)
Reforça o que foi dito por Carl Jung: “Há certos eventos que não percebemos de modo consciente; eles permanecem, por assim dizer, abaixo do limite da consciência. Eles aconteceram, mas foram absorvidos de maneira subliminar. Os aspectos subliminares de tudo o que acontece conosco podem parecer pouco importantes na vida cotidiana, … mas são as raízes quase invisíveis de nossos pensamentos conscientes.”
Ele intitulou o livro como “Subliminar”, a partir da deixa de Jung. Subliminar, em latim, significa “abaixo do limite”. Os psicólogos adotam o termo como referência “ao que está abaixo do limite da consciência”.
“Comecei minha vida profissional como neurologista, tentando aliviar os meus pacientes neuróticos. Eu descobri alguns fatos novos e importantes sobre o inconsciente.
Dessas descobertas, nasceu uma nova ciência: a psicanálise.
Eu tive que pagar caro por esse pedacinho de sorte. A resistência foi forte e implacável. Finalmente, eu consegui. Mas a luta ainda não terminou.” (Sigmund Freud)
Ironicamente, após condenar a Filosofia, Mlodinow abraçou-se com a Psicanálise, embora sem preocupações terapêuticas. Mas, quer respaldar o inconsciente com as novas “descobertas” da neurociência. Acho que Freud não se incomodaria.
“Nosso cérebro subliminar é invisível para nós, porém influencia a nossa experiência consciente do mundo de um modo fundamental – a maneira como nos vemos e aos outros, o significado que atribuímos aos eventos da nossa vida cotidiana, nossa capacidade de fazer julgamentos rápidos e tomar decisões que às vezes significam a diferença entre a vida e a morte, as ações que adotamos como resultado de todas essas experiências instintivas.” (Mlodinow)