
“O ser humano perdeu a capacidade de prever e de prevenir. Ele acabará destruindo a Terra”, disse Albert Schweitzer.
Neste ano, alguns comemoram os 60 anos da publicação de Primavera Silenciosa, de Rachel Carson. Não é um livro qualquer; é um marco na consciência ambiental.
Os festejos por aqui se limitaram à aprovação em regime de urgência na Câmara dos Deputados, do PL 6.299/02, o Pacote do Veneno, que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos e flexibiliza as regras de aprovação e comercialização desses produtos químicos.
O que Carson fez? Pegou uma briga com grandes corporações que enchiam (e enchem) os bolsos com agrotóxicos. Insistia que os seres humanos não tinham o controle sobre a natureza, mas eram apenas uma de suas partes: a sobrevivência de uma parte dependia da saúde de todas.
Ela protestava contra a “contaminação de todo o meio ambiente” com substâncias que se acumulavam nos tecidos das plantas, dos animais e dos seres humanos e tinham o potencial de alterar a estrutura genética dos organismos.
Ora, vivia-se a efervescência da Revolução Verde, um programa de inovações na agricultura que visava aumentar a produtividade através de modificações em sementes, fertilização do solo, mecanização do campo e, uso de agrotóxicos.
Embora seus detratores não soubessem, ela estava com um devastador câncer no seio, em metástase. Morreria pouco depois, em 1964.
“Era 1962, e a indústria química multimilionária não iria permitir que uma antiga redatora do governo, uma cientista sem doutorado e nenhuma filiação institucional, conhecida apenas por seus livros líricos sobre o mar, minasse a confiança pública em seus produtos ou questionasse a sua integridade.
Estava claro para a indústria que Rachel Carson era uma mulher histérica cuja visão alarmista do futuro podia ser ignorada ou, caso necessário, silenciada.
Ela era uma ‘amante dos passarinhos e coelhinhos’, uma mulher que tinha gatos e, portanto, era obviamente suspeita.
Era uma ‘solteirona’ romântica, que estava simplesmente ‘nervosa’ por causa da genética.
Em suma, Carson era ‘uma mulher descontrolada’.
Havia ultrapassado os limites de seu gênero e sua ciência.” (Linda Lear)
Esses eram os argumentos das empresas ‘ameaçadas’: preconceitos nojentos. Nessa época (mas, ainda!), a ciência era Deus, portanto masculina!
Mesmo assim, gastaram algum dinheiro para desacreditá-la e à sua pesquisa e também, ao seu caráter.
Coincidentemente, ontem vi um documentário que mostra o descompromisso de algumas indústrias com o seu usuário final, o ser humano.
No caso, trata-se da indústria de OPMEs e de equipamentos médicos. É de 2018, mas não envelheceu: “Operação Enganosa” (Netflix), que mostra o agressivo marketing para adoção de novos tratamentos e, o papel de agências regulatórias e médicos nesse mercado.
O foco dessas empresas é o intermediário (hospitais e médicos) e a cooptação dos órgãos reguladores, fáceis de “conquistar”.
Sobre Carson, havia publicado um pequeno texto, dois anos atrás:
A consciência ambiental moderna