
“A única definição de macho alfa: se você tentar ser um macho alfa, nunca será um.” Aforismo de Nassim Taleb, a partir da sua leitura de Aristóteles (“Ética a Nicômaco”), para quem a pessoa “magnificente” considera a si mesmo como alguém digno de grandes coisas e, consciente de sua posição na vida, age de acordo com um sistema de ética que exclui a mesquinharia. Requer uma grandeza e nobreza de alma.
Essa introdução é para falar da Guerra da Criméia (entre 1853 e 1856). Talvez me faça entender. Vamos lá.
A Igreja do Santo Sepulcro deve ser controlada por católicos ou por ortodoxos? Essa igreja, lembrando, foi construída por Constantino, a partir das referências passadas por sua mãe, Helena: naquele local Jesus teria sido sepultado.
Ela já gerou muita confusão: chegou a ser a “razão” para as cruzadas.
Na segunda metade do século XIX, esse assunto (assim como o domínio sobre a Igreja da Natividade, em Belém) foi retomado: os católicos, representados pela França e os ortodoxos, pelo Império Russo, aumentaram o tom.
Essa disputa, acreditem, foi o ponto inicial (para o Czar Nicolau I, foi a causa suficiente) para a Guerra da Criméia.
A Teoria do Caos mostra que, em sistemas complexos, há uma alta sensibilidade às condições iniciais, o que pode reforçar instabilidades.
Instabilidades. Havia muito potencial de mudanças no ar. O Império Otomano estava se desmanchando e outros (principalmente o britânico e o Russo) estavam atentos aos destroços.
O Czar Nicolau I se intitulava “Imperador de Todas as Rússias, Rei da Polônia e Grão-Duque da Finlândia”. Ele estava no poder há 28 anos, mas achava pouco o que tinha: jurou conquistar todo o mundo de acordo com o que acreditava ser sua missão sagrada de estender o império dos ortodoxos até Constantinopla e Jerusalém.
Na França reinava Napoleão III, que eleito presidente, resolveu ser imperador, pronto. A guerra contra os russos permitiria, achava, devolver à França uma posição de respeito e influência – talvez não à glória do tio famoso, mas poderia redesenhar o mapa da Europa.
Victor Hugo o apelidou “Napoleão, o Pequeno”.
Os britânicos alegaram ter ido à guerra para defender os turcos da agressão russa, mas na verdade queriam desmantelar o império russo e fortalecer seus interesses de livre-comércio no império otomano.
Para os turcos, era uma questão de lutar por seu império, que desmoronava na Europa.
A guerra começou em 1853 entre forças otomanas e russas na atual Romênia, se espalhou para o Cáucaso e de lá para outras regiões do mar Negro. Em 1854, os britânicos, franceses e a Sardenha se “aliaram” aos turcos, contando, ainda, com o apoio do Império Austríaco.
A questão religiosa era o discurso oficial (católicos x ortodoxos x muçulmanos), porém a russofobia por parte dos europeus estava subjacente.
A derrota deixou os russos com um profundo ressentimento do Ocidente, uma sensação de traição pelo fato de outros Estados cristãos terem se aliado aos turcos e, com ambições frustradas nos Balcãs, o que continuaria gerando atritos e, finalmente, levaria à eclosão da Primeira Guerra Mundial.
Foi o maior conflito do século XIX: morreram cerca de 750 mil soldados, 2/3 deles russos. As baixas civis também foram enormes, embora não estimadas. Foi o modelo de “guerra total” que inspiraria as duas guerras mundiais.
Tínhamos então – como hoje – líderes medíocres, com ambições puramente pessoais, movidos por inspirações mesquinhas.
“O que a história ensina é que os governos e as pessoas nunca aprendem com a história.” (Hegel)