
Políbio foi um historiador e geógrafo. Viveu entre 203 a.C e 120 a.C.
Transcrevo seu texto que trata da causalidade na História. Os fatos históricos têm motivações, porém, gostamos de nos iludir com as aparentes causas de conflitos.
“Alguns historiadores de Aníbal, querendo nos expor as causas pelas quais esta guerra eclodiu entre Roma e Cartago, indicam como causa primeira o cerco de Sagunto pelos cartagineses, e como segunda, a abertura, por parte destes, violando o tratado, do rio que os nativos chamam de Ebro.
Por mim, diria antes que estas são as ‘primeiras manifestações‘, e não estou, de maneira alguma, disposto a admitir que se trata de ‘causas‘ da guerra.
Há que se ir muito mais longe.
De outra maneira, dir-se-á que a passagem de Alexandre pela Ásia é a causa da guerra contra os persas, ou que o desembarque de Antíoco em Demétrias é a causa da guerra contra os romanos, o que não é verdadeiro nem verossímil.
Quem poderia crer, com efeito, que são estas as causas dos enormes preparativos efetuados por Alexandre, e mesmo por Filipe antes de sua morte, tendo em vista a guerra contra os persas?
E, igualmente para os etólios, o surgimento de Antíoco em relação à guerra contra os romanos.
Tais ideias são as de pessoas que não compreenderam a diferença e a distância que separam início (primeiras manifestações), causa e pretexto.
Estes dois últimos vêm antes; as primeiras manifestações só surgem depois.
Quanto a mim, chamo de início de qualquer acontecimento às primeiras ações desenvolvidas a partir de um programa já estabelecido.
Chamo de causas tudo o que precede e prepara as decisões e os planos, isto é, as ideias, sentimentos, e deduções concernentes a tudo que nos leve a decidir e elaborar projetos.
Compreender-se-á tudo o que acabo de dizer através de exemplos.
Quais foram as verdadeiras causas da guerra contra os persas? De onde ela surgiu? É fácil dar-se conta disso, à primeira vista.
Em primeiro lugar, ocorreu a retirada dos gregos, com Xenofonte, das satrápias do interior: eles puderam atravessar toda a Ásia que lhes era hostil, sem que nenhum dos bárbaros ousasse fazer-lhes frente.
Em segundo lugar, deu-se a passagem do rei de Esparta, Agesilau, pela Ásia: este não encontrou nenhuma resistência séria a suas empresas e, se não chegou a nada, foi pelo fato de ter sido obrigado a retornar em virtude das desordens que ocorriam na Grécia, nesse ínterim.
Isto foi o que fez Filipe refletir, e perceber a fraqueza e falta de firmeza dos persas em relação ao valor militar que demonstrava com seus macedônios.
Ele imaginava tanto a grandeza e a beleza do desenvolvimento futuro da guerra, como a simpatia unânime que teria conquistado junto aos gregos.
Tomou imediatamente, como pretexto, a pressa que tinha em vingar as injustiças feitas aos gregos pelos persas.
Tomou a decisão de guerrear, traçou os planos e começou a preparar tudo nesse sentido.
É preciso considerar, por isso, nossas primeiras indicações como as causas da guerra, a segunda como pretexto, e a passagem de Alexandre pela Ásia como suas primeiras manifestações.
Quanto à guerra de Antíoco contra os romanos, é evidente que é preciso atribuir a causa à cólera dos etólios.
Estes pensavam que tinham sofrido, por parte dos romanos, inúmeras afrontas no fim da guerra da Macedônia, como relatei mais acima.
Apelaram eles, pois, a Antíoco, e tomaram a resolução, cada vez mais firme, de tudo fazer e suportar sob o efeito da cólera que se apoderou deles nessas circunstâncias.
É preciso considerar, como pretexto, a libertação dos gregos, que eles proclamavam por todas as partes, percorrendo as cidades com Antíoco, e como início da guerra, o desembarque de Antíoco em Demétrias.
Insisti um pouco nestas distinções, não por espírito crítico em relação aos historiadores, mas para retificar a opinião daqueles que querem se instruir.”