
Em 2019, o presidente chileno Sebastián Piñera pronunciou-se a respeito dos crescentes protestos nas ruas. Lamentou não ter se antecipado à insatisfação popular: “Reconheço essa falta de visão e peço desculpas a meus compatriotas … recebo com humildade e clareza a mensagem que os chilenos nos deram”.
Quando, por aqui, ocorreram os protestos de 2013, a presidente Dilma falou: “Temos que aproveitar o vigor destas manifestações para produzir mais mudanças que beneficiem o conjunto da população brasileira.”
E assim os políticos vão se acomodando à realidade que fingem ignorar. Parecem ficar abobalhados, mas os idiotas somos nós mesmos.
Alceu Amoroso Lima via o Chile e o Brasil como regimes oligárquicos; o primeiro com um domínio absoluto de uma classe, a aristocrática; e, no Brasil, a plutocrática.
No Chile, historicamente vêm-se tentando quebrar essa regra, de forma a permitir à maioria o acesso às riquezas nacionais.
Uma dessas tentativas foi a de José Manuel Balmaceda, que suicidou-se em 1891. Outra, foi a de Salvador Allende, que “suicidou-se” em 1973.
O objetivo de ambos era “derrubar o domínio secular da Oligarquia”, embora que por vias diferentes.
Balmaceda, conforme já comentado aqui tempos atrás, queria introduzir no Chile um regime presidencialista do tipo norte-americano. Mas, logo, encantou-se com os “privilégios do Executivo”, e proclamou uma ditadura.
Allende, deu um passo adiante, ao procurar passar do presidencialismo aristocrático ao socialismo democrático, mas, recusando a ditadura. Teve, então, o mérito de resistir à violência e ao poder absoluto.
Os interesses populares são subjugados e parecem sumir. Parecem; eles ficam latentes e, pequenos incidentes os fazem ressurgir. O povo se cala, mas não se emudece.
Alceu, em plena ditadura (1977), escrevia sua opinião sobre a chamada revolução. Era blindado apenas por sua consciência moral.
Era, a princípio, contra revoluções: “… as revoluções, como as guerras, custam caro, ou em vidas, ou em riquezas ou em decepções. Se a de 1964 não foi, para mim, uma decepção, como tem sido para muitos é que nela nunca acreditei”.
“As sociedades crescem de baixo para cima, como as plantas, de dentro para fora, como os animais, da incapacidade para a autonomia, como os homens.
Renovam-se na proporção em que se rejuvenescem, pela ascensão das massas às elites e ao poder dirigente onde se interpenetram, pela mobilidade social, as diferentes camadas populacionais.
Haverá sempre camadas superiores e camadas inferiores. Mas, na medida em que estas puderem galgar livremente a escala social, com o mínimo de impedimentos e o máximo de liberdade, teremos uma sociedade sadia. (…)
Quanto ao estado de fato, fruto dos golpes militares e das revoluções reacionárias – como o nosso, que exaltam o poder das elites e subestimam ou anulam a promoção do povo e sua participação efetiva no Poder – são Estados utilitários ou pragmáticos e não orgânicos.
São baseados no privilégio das minorias poderosas, que dispõem do dinheiro, das armas ou da técnica, para ‘dar’ ao Povo, arbitrariamente, o que julgam ser do seu interesse, começando por anestesiá-lo para evitar que reivindique violentamente seus direitos.” (novembro de 1973)