
“Para que cometer a loucura de chorar porque daqui a cem anos não viveremos, e por que não fazer o mesmo porque há cem anos não vivíamos?”
Montaigne, com seu realismo. Para ele, “a contínua tarefa da nossa existência é levantar o edifício da morte”.
Como Cícero, acreditava que filosofar nada mais é do que preparar-se para a morte: “toda a sabedoria e raciocínio do mundo se concentram num ponto, o de nos ensinar a não termos medo de morrer. “
No seu Ensaios, citava alguns pensadores:
“Aos mortais empresta-se a vida por um momento; a vida é a carreira dos jogos em que a tocha passa de mão em mão.” (Lucrécio)
“Na mesma hora em que nascemos diminui a duração da nossa vida.” (Sêneca)
“Nascer é começar a morrer; o último momento da nossa vida é a consequência do primeiro.” (Manílio)
Como somos arrendatários da existência, que tiremos dela o maior proveito, não é?
“Se não soubemos fazer o uso conveniente da vida, se nos era inútil, que nos importa tê-la perdido?”, perguntava Montaigne, repercutindo Manílio: “Para que querer multiplicar os dias, que deixarias perder como os anteriores, sem os empregar melhor?”
“Ali, onde acaba, está toda a vossa vida. A utilidade de viver não reside no tempo, mas no uso que se fez da vida: tantos dias viveu que viveu pouco.
Aproveitem-na enquanto permanecem no mundo: depende da vossa vontade, não do número de anos, o terem vivido bastante.
Pensam não chegar ao lugar para onde caminham sem cessar? Não há caminho que não tenha a sua saída.
Mil homens, mil animais e mil outras coisas morrem no mesmo instante em que morremos.” (Montaigne)
A morte tem suas características de inevitabilidade e imprevisibilidade.
“O homem nunca pode prever, por avisado que seja, o perigo que o ameaça a cada instante”, e, “Para que formar tantos projetos numa existência tão curta?”, cantava Horácio.
Para que sofrer com tantos problemas, a grande maioria, falsos problemas? Conheço muitos para quem, um dia sem problemas parece um dia não vivido.
Plínio, o Velho, conta que Ésquilo havia ouvido, em uma profecia, que o teto de uma casa cairia em sua cabeça – e apostou que, do lado de fora, escaparia do destino trágico. Morreu quando uma tartaruga se desprendeu das garras de uma águia, acertando-lhe a cabeça.
Tem a história do imperador Qin Shi Huang, um estadista célebre, primeiro líder da China unificada. No final da vida, porém, com medo da morte, chamou seus médicos. Esses concluíram que a receita ideal para a imortalidade eram pílulas de mercúrio. Tomou, morreu.
Resumia Montaigne: “… quem aprendeu a morrer esquece a servidão; não há mal possível na vida para aquele que compreendeu bem que a privação da mesma não é um mal: saber morrer livra-nos de qualquer sujeição e obrigação.”