No ano passado, duas mulheres – Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna – ganharam o Nobel de Química, pela descoberta da tesoura genética ou molecular, conhecida como CRISPR/Cas.
Segundo o júri, essa premiação objetivava recompensar “o desenvolvimento de um método de edição de genes que contribui para o desenvolvimento de novas terapias contra o câncer e pode tornar realidade o sonho de curar doenças hereditárias”.
Este sistema permite manipular, detectar, criar imagens e anotar sequências específicas de DNA e RNA em células vivas de diversas espécies. A facilidade de uso e sua robustez revolucionaram a edição do genoma para pesquisas que vão da ciência fundamental à medicina translacional.
A medicina translacional, basicamente, visa agilizar a transferência de resultados de pesquisa básica para pesquisas clínicas.
Novos avanços não param e estão melhorando consideravelmente a compreensão dos processos biológicos e impulsionando as ferramentas baseadas em CRISPR-Cas para o uso clínico em terapias genéticas e celulares.
Está aberta uma caixa de Pandora. O que daí pode sair requer um permanente exame ético.
Já em 2018, o apressado cientista chinês He Jiankui anunciou ter alterado o DNA dos embriões de duas bebês gêmeas para torná-las resistentes ao HIV, caso elas entrassem em contato com o vírus.
Pesquisa realizada depois aponta que elas podem ter sido mutadas de um modo que reduzirá sua expectativa de vida. Efeito indesejado.
Lembra o caso da ovelha Dolly, clonada em 1996. Ainda hoje não se conhece bem a influência da clonagem nos processos de envelhecimento.
Esses efeitos colaterais talvez não sejam os maiores problemas.
Espera-se que a técnica de edição genética possa eliminar doenças hereditárias como anemia falciforme, Huntington, fibrose cística … até, quem sabe, nos tornarmos menos suscetíveis a vírus mortais. Ótimo.
E quando forem facultadas escolhas sobre cor dos olhos, da pele, altura, calvície, QI …?
Como seria o acesso a essas possibilidades? Gratuito, aberto a todos?
O que pode ocorrer com a diversidade humana e a desigualdade social?
Voltarei ao assunto.