
“(…) Por tudo que pelo sentido
se pode cá compreender
e quanto se pode entender,
ainda que seja muito elevado,
nem por graça e formosura
eu nunca me perderei,
mas sim por um não sei quê
que se alcança por ventura.”
No místico João da Cruz (1542-1591) há um desejo de infinito; um desejo que só o infinito poderia satisfazer.
Ele sabe que o desejo não é propriamente um objeto; também os rejeita todos, sem nuances, como simulacros ou ‘míseros milagres’ em sua pretensão de satisfazê-lo. Para ele, assim como para sua amiga Teresa de Ávila, “só Deus basta!”.
Deus se revelaria não somente como o “outro que não si mesmo”, mas como o “Outro de si”.
Justamente porque Deus não é somente “outro que não eu mesmo”, existiria a possibilidade de divinização. É o Espírito que faz de nós o outro de Deus. Pelo Amor, o “outro que não eu mesmo” se tornaria o “Outro de mim”.
“Nem os bens temporais, nem os bens naturais, sensíveis ou espirituais, nem mesmo os bens carismáticos, tão úteis para a Igreja, podem constituir o objetivo da existência humana. Todos esses são limitados ao tempo e espaço, e a capacidade infinita de nossa alma reclama um Bem infinito”, interpreta Jean-Yves Leloup.
“Tudo é nada a não ser Deus.” (João da Cruz)
Desejar qualquer coisa que não Tudo (Deus) não poderia ser o desejo da vida humana. O desapego a tudo que não seja o Tudo, o morrer para as coisas que nos entretêm, é o caminho: “Se o grão de trigo que cai na terra não morrer, permanecerá só; mas se morrer, produzirá muito fruto.” (Jo 12-24)
“O que Deus pretende é fazer-nos deuses por participação, sendo-o ele por natureza, como o fogo que converte tudo em fogo. (…)
Deus faz morada substancialmente em toda alma, ainda que ela seja a do maior pecador do mundo. Esta espécie de união existe sempre entre Deus e as suas criaturas (…)” (João da Cruz)