
Honra é um ‘valor’ para os aspirantes à riqueza; a classe média. Se o universo fosse constituído por sábios e filósofos, seria diabolicamente triste. Sabedoria válida é a de Salomão: beber bons vinhos, saborear pratos delicados, rolar sobre belas mulheres, repousar em camas macias. Excetuando-se isto, o resto é vaidade.
Esses são pensamentos do sobrinho de Rameau, numa sátira de Diderot contra a sociedade burguesa.
Rameau refere-se ao grande músico Jean-Philippe Rameau, do século XVII.
O sobrinho de Rameau “é um dos mais bizarros personagens que Deus não deixou faltar. É um misto de altivez e baixeza, de bom senso e de desatino. Mostra as boas qualidades que a natureza lhe deu sem ostentação, e as más, sem pudor. Ele vive seu dia a cada dia. Triste ou feliz, de acordo com as circunstâncias. Sua primeira preocupação pela manhã ao levantar, é de saber onde irá almoçar …”
Às vezes conseguia introduzir-se em algumas casas honestas, “onde tinha seu lugar à mesa, com a condição, porém, de não falar sem ter obtido permissão”. Se abrisse a boca para falar suas opiniões, ouvia: “Ó Rameau!”. Voltava ao silêncio.
Mais, de sua ‘filosofia’:
- Defender a pátria? Vaidade. Não há mais pátria, só tiranos e escravos.
- Servir aos amigos? Temos amigos? Se os temos, devemos torná-los ingratos, ao tentar servi-los? Isso é o que normalmente acontece. O reconhecimento é um fardo.
- O que tenho feito? O que você, eu e todos os outros fazem: o bem, o mal e nada.
- Se vejo meu tio? Sim, quando passa pela rua. É um filósofo: só pensa em si e o resto do mundo lhe é totalmente indiferente.
- Quem é obrigado a saber o que ensina? E há os piores, aqueles que acreditam saber alguma coisa.
- O mal sempre apareceu por aqui por meio de algum homem de gênio.
- O importante é ir todas as noites fácil, livre, agradável e copiosamente ao banheiro. Esse é o grande resultado da vida em todas as condições.
- Certa vez ouvi de Choiseul (ministro do rei da França de 1758 a 1760) que “a ignorância faz a felicidade dos povos”. Que nada era mais útil aos povos que a mentira, que nada era mais prejudicial que a verdade.
Denis Diderot, 1713-1784, era filho de pais ricos. Aos dez anos foi matriculado num colégio jesuíta; seria padre. Mas, aos quinze anos, muda de ideia e segue para Paris para estudar Artes. Em seguida à sua formação, abandona tudo e passa a viver uma vida boêmia durante dez anos.
Para se sustentar, trabalha como tradutor. Em 1745, recebe um convite para traduzir do inglês a ‘Enciclopédia das Ciências e das Artes’, de Ephraim Chambers.
Como estava desatualizada, Diderot é desafiado a refazê-la e amplia-la. Daí nasceu a Enciclopédia francesa, em 36 volumes.