
Erich Fromm era psicanalista. Viveu até 1980. Suas ideias sobre psicologia das religiões deixaram muitos desconfortáveis.
Dizia que Deus – consultado ou não – é sempre o aliado dos governantes. Estes, quando expostos à crítica, valem-se de Deus, que em virtude de sua irrealidade despreza as críticas e pela sua autoridade confirma a autoridade dos poderosos. Essa situação psicológica de servidão infantil garantiria a estabilidade social. A elite teria, então, a função de manter e fortalecer nas massas a dependência psíquica infantil e impor-se a seu inconsciente como a figura do pai.
A religião é o principal meio para isso. Cabe a ela “impedir a independência psíquica da parte do povo, de intimidar intelectualmente, de provocar uma docilidade infantil, socialmente necessária, para com as autoridades. Ao mesmo tempo, oferece às massas certa satisfação que torna a vida suficientemente tolerável e impede que elas passem de filhos obedientes a filhos rebeldes.”
A religião serve para tornar mais fácil às massas se resignarem a muitas frustrações que a realidade apresenta.
Repetia Freud: “As ideias religiosas, apresentadas como ensinamentos, (…) são ilusões, a realização dos mais antigos, estranhos e prementes desejos da humanidade.”
Um dos desses principais desejos é o de “proteção“, preferencialmente através do amor. Uma extensão da impotência infantil.
Num livro emblemático, dos anos 50, “O Dogma de Cristo“, que li, assustado, aos 20 anos, ele fala sobre Jesus e o cristianismo primitivo.
Lembra que a sociedade judaica, à época, embora sob o jugo dos romanos, tinha basicamente três ‘classes’: os saduceus, abastados e superiores – uns poucos; os fariseus, que abrangiam os setores médio e inferior da população urbana; e, os Am Ha-aretz (povo da terra), os claramente pobres – segundo os fariseus, judeus sem instrução que foram considerados como sendo negligentes em sua observância dos mandamentos.
Era um período de revoltas, revolucionárias e messiânicas.
As pessoas que seguiam o Cristianismo primitivo eram, basicamente, os incultos, os pobres, proletários de Jerusalém e camponeses; aqueles mais oprimidos e que sentiam mais a necessidade de se modificar as condições existentes. O que os movia eram o ódio e a esperança. Ódio pelos romanos e principalmente pelos que os aceitavam.
A mensagem de Jesus, iniciada por João Batista, era de que “o Reino de Deus” logo chegaria, e poria um fim às injustiças.
“Os cristãos primitivos eram homens e mulheres pobres, incultos, que constituíam as massas oprimidas do povo judeu e, mais tarde, de outros povos. Ao invés de aumentar a impossibilidade de transformar sua situação desesperada através de meios realistas, evoluiu entre eles a esperança de que a transformação ocorreria dentro de pouco tempo, num momento, e que encontrariam então a felicidade que lhes faltava, mas que os ricos e os pobres seriam punidos de acordo com a justiça e os desejos das massas cristãs.” (Erich Fromm)
Eram entusiastas, unidos pela esperança e pelo ódio.