
Joan Brossa (1919 – 1998). Esse poeta é ícone de criatividade; sua obra se caracteriza pela experimentação e pelo humor, é engajada e irônica. Sua obra poética está ligada às suas raízes catalãs e à denúncia social.
Artista múltiplo; seus territórios eram artes plásticas, teatro, música, cinema, cultura popular, design gráfico, circo, cabaré e, política. Também se interessava por magia, mágica e ocultismo. Por um período, sobreviveu como comerciante – de livros de autores proibidos pelo franquismo. Publicou mais de oitenta livros de poesia, quatro de prosa, mais de trezentas peças de teatro, mil e quinhentos poemas visuais …
Lembro de uma antológica exposição dele no Centro Maria Antônia, da USP, em 2005.
Há muitas histórias sobre Brossa. Antônio Cícero, ouviu a seguinte, de João Cabral, que era o grande amigo de Brossa no Brasil:
“A visita foi uma delícia. Cabral estava proibido de beber, mas nos serviu uísque e, de vez em quando, escondido de Marly de Oliveira, sua mulher, dava uma bicada no copo da Susana. Ele estava muito alegre e nos contou várias histórias sobre o jovem Brossa. Narrava-as com muito humor, mas com o rosto sério. Ria por dentro. Uma das histórias ainda me faz pensar.
Certa vez, ele e Brossa vinham pela rua, conversando, quando, sem mais nem menos, o poeta catalão começou a falar de modo desarticulado e a fazer gestos amalucados.
Cabral só entendeu o que se passava quando percebeu que os avós de Brossa se aproximavam. É que este, embora já não fosse criança, continuava a ser sustentado por eles, que o consideravam deficiente mental – e ele fazia tudo para mantê-los nessa convicção.”
Lluis Permanyer assim o descreve:
“O suéter, cigarro nos lábios, um bom prato de legumes com um copo de vinho de mesa, sapatos surrados, sempre a pé ou de ônibus, ou seja, natural, simples, humano, fiel a si mesmo: este é o perfil de Brossa que sempre quisemos e que, espelhados, seguiremos admirando”.
Era adepto da ‘poesia visual’ que, com sua natureza híbrida, nos leva a decodificar várias linguagens, geometria, plasticidade, ícones, grafias, cromatismo, provocando outra leitura de diferentes efeitos sensoriais.



O poema “As Nuvens”, de João Cabral, de 1945, foi traduzido para o catalão por Brossa e publicado na sua revista:
As nuvens são cabelos
crescendo como rios;
são gestos brancos
da cantora muda;
São estátuas em voo
à beira de um mar;
a flora e a fauna leves
de países de vento;
São o olho pintado
escorrendo imóvel;
a mulher que se debruça
nas varandas do sono;
São a morte (a espera da)
atrás dos olhos fechados
a medicina, branca!
Nos dias brancos.