Nossa vida é exígua. Triste isso, para a maioria (há os que já se encheram dela). Mas, esse ser que se pensa como pessoa, consciente de si (achamos que somos), é mero veículo do eterno (ou do muito antigo).
A morte é desintegração. A morte em vida significa a despersonalização, o sentimento predominante de desagregação, de falta de referência própria – em si.
A morte física é a interrupção do ciclo de informação que carregamos no nosso genoma, quando suas proteínas reguladoras e o RNA interrompem suas rotinas.
Enquanto vivos, servimos como hospedeiros de micróbios. Eles nos acompanham até depois de nossa morte, ajudando-nos na nossa decomposição.
Quando nos sentimos saudáveis somos o lar para cerca de 10 mil espécies de microorganismos. São trilhões de bactérias e vírus que povoam as diferentes partes do nosso corpo, o que dá de 1 a 2 kg. Num centímetro quadrado de pele humana há mais de 100 mil micróbios. Para cada célula humana existem ao redor de dez células microbianas.
Não nos orgulhemos: uma colher de chá de terra tem cerca de um trilhão de micróbios.
E esses bichinhos são muito apegados à perpetuação: a bactéria Escherichia coli, simpaticamente conhecida como E. coli, se reproduz 72 vezes num dia.
E, alguns deles surgiram na Terra há 3,8 bilhões de anos (ironicamente, são chamados de ‘micróbio’, pequena vida, embora sejam quase eternos como espécie). O ser humano só os “descobriu” no século XVII. Mas eles já haviam nos descoberto 350 mil anos atrás, quando nossa espécie surgiu. Nós só percebemos que eles poderiam nos causar doenças no final do século XIX.
Depois da desintegração de nosso corpo, voltamos – de certa forma – a ser eternos. Voltamos a ser partículas, que nasceram durante os primeiros segundos de existência do universo. Esses átomos, a partir dos quais se formaram as moléculas e macromoléculas do nosso fugaz organismo, voltam para o colo do Universo. E vão se reorganizar noutras manifestações, sob a trama do mistério.
Mistério que também carregamos. Não à toa nos reconhecemos como filhos do Céu.
“Crer que um homem é um ser supranatural é um erro que levou à ideia louca do homem senhor da natureza, que ia conquistá-la e dominá-la. Isolar a vida da matéria é uma ideia louca e que, hoje em dia, é comprovadamente falsa.” (Edgar Morin, 1992)
Ah a pretensão, indissociável dos nascidos de boa vontade.
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