Tudo que acontece conosco está predefinido? O determinismo, um filme já editado, é o que assistimos? George Ellis, professor de Sistemas Complexos e Matemática Aplicada, garante que a incerteza molecular nos mostra que isso não é verdadeiro.
Apresento um resumo de suas ideias. O texto original está citado abaixo.
Laplace acreditava que o Universo era uma espécie de maquinário e que a física poderia determinar tudo. Napoleão, que havia lido o trabalho de Laplace, o confrontou sobre a ausência de um criador em sua teoria. “Eu não precisei dessa hipótese”, foi a resposta. Laplace poderia ter dito a mesma coisa sobre o livre arbítrio, que seu universo mecanicista tornou supérfluo.
Tudo o que vemos ao nosso redor é composto de nada além de prótons, elétrons e nêutrons reunidos de maneiras muito complexas. No caso do seu corpo, eles produzem muitos tipos de células; por sua vez, essas células produzem tecidos, como músculo e pele; esses tecidos produzem sistemas, como coração, pulmões e cérebro; e esses sistemas formam o corpo como um todo. Pode parecer que tudo o que está acontecendo nos níveis mais altos (“emergentes”) deve ser determinado exclusivamente pela física que opera abaixo deles. Isso significaria que os pensamentos que você está tendo neste exato momento foram predeterminados no início do Universo, com base nos valores das variáveis da física de partículas naquele momento.
Para vincular a física e a biologia, precisamos examinar a teoria subjacente à forma molecular. E essa teoria é a química quântica, baseada na equação fundamental da física quântica: a equação de Schrödinger. Na teoria quântica, o estado de um sistema é descrito pelo que é conhecido como função de onda, que determina as probabilidades de diferentes resultados quando os eventos ocorrem. A equação de Schrödinger governa como a função de onda muda com o tempo.
A questão real é: a equação de Schrödinger, juntamente com o estado inicial da função de onda que descreve tudo o que existia no Universo primitivo, determinaria tudo o que penso hoje, porque determinaria os estados de todas as biomoléculas no meu corpo?
Ellis contraria os céticos do livre-arbítrio ao afirmar que “todos os resultados não dependem apenas das equações e dos dados iniciais. Eles também dependem de restrições.”
Seu pensamento está alinhado com os de Denis Noble e Raymond Noble, sobre como a ordem pode emergir do caos: “a aleatoriedade molecular oferece aos mecanismos celulares a opção de escolher os resultados que eles desejam e descartar os demais. Esse poder de escolha permite que sistemas fisiológicos, como coração e cérebro, funcionem de uma maneira que não seja escravizada pelas interações de nível inferior, mas, ao invés disso, escolha os resultados das interações preferidas em uma variedade de opções. Dessa maneira, uma camada de ordem pode emergir da ‘desordem’ – e dos microdados – no nível mais baixo.”
Esta, conclui, não é uma prova definitiva de que o livre arbítrio existe, mas pelo menos abre uma maneira de existir.
(Imagem: On a mountain road from Koya to Ryujin, Japan. 1998. Photo by Peter Marlow/Magnum)